domingo, 21 de agosto de 2011

Crítica: Revoluções marinhas (por Humberto Giancristofaro)

foto de Núbia Abe

Crítica da peça A Mar Aberto do Coletivo Artísticos Atores à Deriva
Autor: Humberto Giancristofaro

A Mar Aberto foi o primeiro trabalho do Coletivo Artístico Atores à Deriva feito em 2008 na cidade de Natal. Conta a história de um velho capitão pescador que se apaixona por um jovem mancebo. Apesar da primeira temática que salta aos olhos referir-se a lida com as incompreensões acerca da sexualidade, há uma acentuação possível quanto à ontologia dos desejos em geral. A dramaturgia assinada pelo diretor Henrique Fontes tenciona a personalidade endurecida de um velho lobo do mar com a descoberta de novas impressões sensíveis. Conturbado por suas paixões, Hermínio (Doc Câmara) narra sua história a Seu José Tarrafeiro: do embrulho no estomago quando avista pela primeira vez o novo tripulante de sua traineira, ao momento desesperador da inevitável separação. 

A encenação intercala os momentos narrativos com flashbacks da história contada. Por meio desse artifício podemos notar que o embaraço do capitão nasce do conflito entre seus paradigmas. De um lado ele segue o meio convencional de interpretar seus afetos, do outro ele sofre de um desejo incondicional que foge a tudo que ele conhece. Não é suficiente a justificativa encontrada em suas crenças para a origem dessas sensações – ele culpa o tinhoso por sua volúpia – por isso ele embarca numa viagem interior em busca da fonte dos desejos. Com essa intenção a trama assume um caráter semelhante ao do romance de formação. O personagem evolui no decorrer da peça produzindo uma consciência de algo que ele não sabia. Essa construção vai demandar um jogo magistral do elenco para transmitir tais sensações, a fim de produzir na plateia afecções semelhantes.

O primeiro artifício para tanto provêm do ambiente cênico. Um emaranhado de cordas grossas e placas de isopor prestam referência a um atracadouro. Associado ao figurino de trapos e ao visagismo, todo o imaginário de histórias de pescador veem à tona, auxiliando o espectador a compactuar com essa identidade. O segundo recurso toma forma pelo desenrolar da peça expondo um desenho sonoro de Danúbio Gomes, cuidadosamente trabalhado. Este é composto tanto pela métrica do texto, quanto por efeitos sonoros especiais, embora de uma simplicidade impar, como uma chuva de quilicas e lacres de latinhas que produzem a melodia de uma tempestade em alto mar. 

foto de Núbia Abe
Em suma, esse espetáculo lida com signos sensíveis inerentes ao homem e que tem força de transcender uma moral. O resultado é uma transformação do personagem em algo para além da sua realidade, as decisões de Hermínio de não reconstruir sua barca após o naufrágio e de se reportar ao Seu José Tarrafeiro para aprender a profissão de fazer tarrafas, atualiza sua condição de pescador, sem perder o contato com o mar, mas mantendo-se prudentemente à distância.

Um comentário:

falecomdaniel_ disse...

GENTE! quem viu sabe o quanto foi FODONA essa peça! pra quem nao viu olha corre pra NATAL!!! kk